Jorge Hessen
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Christian McPhilamy, um garoto de 8 anos, de Melbourne, na Florida, EUA, decidiu deixar os cabelos crescerem a fim de fazer perucas para crianças com câncer. McPhilamy teve a ideia há alguns anos, assistindo a um comercial de câncer pediátrico. Na ocasião descobriu que as crianças ficavam carecas com a quimioterapia e que poderia ajudá-las doando os próprios cabelos. Para isso, deixou seus cabelos crescerem. Ficou tão cabeludo que começou a sofrer bullying na escola, todavia, suportou as críticas e o assédio moral. Foram dois anos de provocações de colegas e adultos que o chamavam de menina. Quando as madeixas já estavam bem longas, ele raspou a cabeça e doou 30 centímetros de cabelos a uma instituição que faz perucas gratuitas para cancerosos.
Por falar nisso, no Irã, o professor Ali Mohammadian percebeu que Mahan Rahimi, de oito anos, um dos seus alunos, era portador de uma doença rara que provoca a perda dos cabelos. Rahimi ficou muito isolado depois de ter ficado careca, sua alegria desapareceu completamente e o professor, preocupado com desempenho escolar do menino por causa do bullying, decidiu raspar a cabeça e ficar careca como o menino a fim de dar um basta às agressões verbais e físicas que Mahan sofria no colégio. Alguns dias depois, inspirados pelo professor, todos os colegas de turma de Mahan decidiram raspar o cabelo também, gerando uma onda de solidariedade que surpreendeu a todos. A corajosa atitude do professor foi amplamente divulgada nos meios de comunicação do Irã e Ali Mohammadian tornou-se um herói nacional.
Quando visitamos o doente no leito de um hospital, quando estendemos às mãos ao preso no cárcere, quando expedimos um cartão de “feliz aniversário” para um amigo, quando doamos o farnel de cesta básica para a família carente, quando telefonamos para alguém que não vemos há muito tempo, quando prestamos atenção no próximo, estabelecemos um vínculo solidário.
Obviamente, a solidariedade é uma palavra que assombra os individualistas, porque inflige a mobilização de recursos em favor do próximo, porém gostem ou não é a lei da assistência mútua e da dependência recíproca, sem a qual todo progresso, no planeta, é praticamente impossível. A Lei que rege as relações sociais impulsiona o homem à solidariedade e ao amor, fagulha sublime que todos, sem exceção, têm no coração, haja vista que um homem, por mais abominável que seja, vota a alguém, a um animal ou a um objeto qualquer, viva e ardente afeição.
Allan Kardec indagou aos Espíritos se “o homem, ao buscar a sociedade, obedece apenas a um sentimento pessoal ou há também nesse sentimento uma finalidade providencial de ordem geral? Os Benfeitores esclareceram: O homem deve progredir, mas sozinho não o pode fazer porque não possui todas as faculdades; precisa do contato dos outros homens. No isolamento, ele se embrutece e se estiola”.[1]
Ser solidário é sentir necessidade íntima de dividir algo ou alguma coisa com o próximo. A solidarização é o anseio de identificação com as dificuldades dos outros, que leva as pessoas a se auxiliarem mutuamente. É o compromisso pelo qual nos percebemos no comprometimento de ajudar-nos uns aos outros. Sem o devido culto à solidariedade nossos passos, por mais firmes, não surpreenderiam à frente senão intranquilidade e agitação, discórdia e destruição. Tudo é interdependência e sustentação recíproca em toda natureza, para que desfrutemos a experiência da existência física rumo a nobre elevação à imortalidade vencedora.
Em Devon, Inglaterra, a senhora Molly-Mole Povey, preocupada com seu filho Roman que reclamou não ter amigos na escola, deliberou postar uma mensagem no Facebook solicitando às pessoas que almejassem um“feliz aniversário” ao filho. A mensagem de Molly “viralizou”[2] e centenas de cartões chegaram à casa da família, até mesmo de lugares distantes como Nova Zelândia, Dubai, Finlândia, Dinamarca, Egito, Noruega, Alemanha e Austrália. Na verdade , Molly-Mole aguardava apenas que algumas pessoas da escola dessem um cartão “virtual” a seu filho, mas (o post) foi muito compartilhado e as pessoas do mundo inteiro se ofereceram para enviar cartões de “boas festas”. Isso é prova cabal que o ser humano tende à solidariedade.
Aristóteles, o filósofo grego, afirmou que “o homem é um animal social”, isto é, ele não basta a si mesmo, pois (re)nasceu para interagir com o seu semelhante. Emmanuel ensina que a Terra deve ser considerada escola de solidariedade para o aperfeiçoamento e regeneração de todos nós. “Na dor como na alegria, no trabalho feliz como na experiência escabrosa devemos considerar a reencarnação um processo de sublime aprendizado fraternal, concedido por Deus aos seus filhos, no caminho do progresso e da redenção.”[3] Todavia, diversas criaturas, de um modo geral, ainda têm muito da tribo, encontrando se encarcerados nos instintos propriamente humanos, na luta das posições e das aquisições, dentro de um egoísmo quase feroz, como se guardassem consigo, indefinidamente, as heranças da vida animal. “A fraternidade [solidariedade]conquista uma nova expressão no íntimo da criatura, a fim de que o Espírito possa alçar o grande voo para os mais gloriosos destinos.” [4]
Fraternidade [solidariedade] pode traduzir-se “por cooperação sincera e legítima, em todos os trabalhos da vida, e, em toda cooperação verdadeira, o personalismo não pode subsistir, salientando-se que quem coopera cede sempre alguma coisa de si mesmo, dando o testemunho de abnegação, sem a qual a fraternidade não se manifestaria no mundo, de modo algum.” [5]
Dentro dos autênticos manifestos cristãos, nasce a solidariedade, que só pode ser exercida pelos que não vivem somente para si. Atendamos aos impositivos da solidariedade e compreendamos que a Lei Divina, em tempo algum, nos sugere isolamento que, na verdade, é sempre egoísmo, ainda mesmo quando nos ausentemos da batalha humana, sob a argumentação de cultivar a virtude e garantir a fé.
Observemos que a própria família consanguínea é uma ordem de auxílio mútuo. Ninguém reencarna sem o desvelo do berço e o berço é sucessivamente o desvelo de mãe, o arrimo do pai a desfazer-se em disposições de paz e luz. A solidariedade é uma atitude que tem uma função preponderante nesta batalha travada pelo homem contra si próprio. Alguns infelizmente permanecem sob o jugo da solidão, do estar em si mesmo, no seio de um agrupamento de sete bilhões de pessoas. Ser solidário é acudir incondicionalmente os que carecem de ajuda. Não podemos cair na vala profunda do egoísmo, ou seja a vala que a experiência já demonstrou não ser tapada por bens materiais. Um buraco que só pode ser preenchido por uma vida honrada, cujo desígnio básico é ser solidário , pelo simples prazer de sê-lo.
Nota e referências bibliográficas:
[1] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, RJ: Ed. FEB, 2000, perg. 768:
[2] Espalhar(-se) de maneira a criar um efeito semelhante ao de um vírus.
[3] XAVIER, Francisco cândido. O Consolador, ditado pelo espirito Emmanuel , RJ: Ed. FEB, 2002,
[4] idem
[5] idem