Jorge Hessen
http://aluznamente.com.br
Desde o lançamento da Revista Espírita, em 1858, na França, por Allan Kardec, a imprensa espírita é possante canal da divulgação doutrinária para interligação dos centros e demais instituições e, sobretudo, para disseminação de opiniões e discussão de temas sócio-doutrinários, propondo a adequada orientação ao Movimento Espírita. A rigor, ela também se dirige ao público não espírita para esclarecimento doutrinário. O Codificador noticiava e comentava na R.E. diversos eventos extra-doutrinários, que de alguma forma interessavam a todos os leitores.
As civilizações iniciaram-se com a imprescindível necessidade da comunicação, recorrendo ao mecanismo da tradição oral. O grande salto da comunicação humana consubstanciou-se na imprensa (palavra escrita), cujo mestre foi Johannes Gutenberg, considerado “O Pai da Imprensa”. Quatro séculos após a descoberta desse notável filho da Mogúncia (Alemanha), Allan Kardec, embora sempre advertindo contra o proselitismo indigesto, recomendou a divulgação dos princípios doutrinários com base no bom senso. É verdade! A propaganda doutrinária para fazer prosélitos não é a necessidade imediata do Consolador Prometido, até porque “a direção do Espiritismo, na sua feição de Evangelho redivivo, pertence ao Cristo e seus prepostos, antes de qualquer esforço humano, precário e perecível”. (1)
Para delinearmos considerações sobre a imprensa espírita no Brasil, trazemos à baila alguns informes sobre os contributos de Luiz Olímpio Teles de Menezes, considerado pioneiro da imprensa espírita brasileira. Em julho de 1869, três meses após a desencarnação do Codificador, lançou o periódico O Eco d'Além-Túmulo, subintitulado "Monitor do Espiritismo no Brasil", de publicação bimestral. Antes, já havia fundado em 17 de setembro de 1865, em Salvador, o Grupo Familiar do Espiritismo, considerado a primeira instituição espírita no Brasil. Escreveu para o "Diário da Bahia", "Jornal da Bahia", "A Época Literária". Foi um causídico intransigente dos princípios espíritas.
"Era um caráter digno de todo o apreço pela sua cultura e elevação de sentimentos, aprimorados por uma longa série de infortúnios, que soube sempre suportar com honra e grandeza d’alma". (2) Certa vez, redigiu uma “Carta Aberta” ao Primaz do Brasil, D. Manoel Joaquim da Silveira, refutando a pastoral que este publicou, com o título “Erros perniciosos do Espiritismo”. A “Carta” de Luiz Olímpio é considerada a primeira obra de divulgação espírita de um brasileiro, publicada na Pátria do Evangelho.
O "Grupo Familiar do Espiritismo" cumpriu sua tarefa por cerca de um decênio, até a fundação da "Associação Espírita Brasileira", que representou o marco inicial do movimento espírita brasileiro. Teles de Meneses foi o primeiro presidente da Associação, instituto que visava "ao desenvolvimento moral e intelectual do homem nas largas bases que cria a filosofia espirítica, e a exemplificação do sublime e celestial preceito da caridade cristã.”. (3)
Na verdade, a imprensa espírita brasileira surgiu integrada em sua dupla função libertária. Lutando pela emancipação espiritual do homem, lutando também na sua alforria material. Menezes compreendeu que não podia sustentar os princípios espíritas de fraternidade e caridade se não desse seu testemunho contra o desumano sistema de escravidão negra no Brasil. “Na campanha abolicionista através de O Eco d'Além-Túmulo, destinou um mil réis de cada assinatura para a libertação de crianças negras de sexo feminino entre 4 e 7 anos”. (4)
Sendo o Espiritismo uma doutrina de vivência igualitária, anunciada para influir na transformação social, não se pode idear uma imprensa espírita desatenta ao mundo, sepultada em si mesma. Os legados de Teles de Menezes nos comprovam que jornais e revistas espíritas não podem ser somente boletins doutrinários apartados do fato social. Inobstante, não devem exceder os limites das instâncias espíritas e envolver-se em altercações político-partidárias ou contendas de grupos. Sua função principal é esclarecer e orientar os rumos da doutrina.
No Brasil, considerado o maior país espírita do mundo, em extensão e abrangência, e em número de adeptos, há inúmeras publicações escritas, bem como centenas de emissoras de rádio e algumas televisões (abertas, por assinatura e Internet) veiculando informações espíritas, além da existência de milhares de portais espíritas na Rede Mundial de computadores. A despeito desse cenário, não é difícil constatar que faltam meios de comunicação arejados (jornais, revistas, sites, televisão, rádio), que se pode ter confiança sem a percepção desagradável de sufocação, de constrangimento subserviente a direções excêntricas. Muitos jornais e revistas “chovem no molhado” e repetem o que todos sabem e já disseram. Somente publicam mensagens mediúnicas e acanhados artigos sobre questões já pacificadas. Evitam a discussão saudável, o debate coeso, como se estivesse submetida a uma orientação ditatorial.
Há órgãos da imprensa doutrinária que se restringem ao centro espírita como se fossem boletins particulares, alguns ficam circunscritos a um bairro ou a uma pequena cidade, outros se colocam a serviço da difusão espírita em nível nacional e internacional. Talvez seja a reprodução da falta generalizada de cultura na sociedade e notadamente da pouca cultura espírita. Por isso há órgãos de divulgação doutrinária sem nenhum critério, nem discernimento. Divulgam assuntos contraditórios e revelam ausência de conhecimento ou displicência de seus diretores, editores e redatores.
É imperioso alterar esse cenário; é urgente maior consciência jornalística aos que militam na imprensa espírita. Na Revista Espírita de maio de 1863, Kardec conta que certa vez tinha recebido três mil mensagens de várias partes da Europa, aguardando uma possível publicação. Selecionou cem que continham temas de moralidade inatacável. Fez nova triagem e, das cem, chegou a trinta, realmente de ótimo valor estético e moral. Porém, das trinta mensagens, só cinco apresentavam real valor para obterem espaço na Revista Espírita. (5)
Raros são os escritores e jornalistas que têm a coerência de escrever não para amimar ou desgostar, mas para abrir os olhos e acordar consciências. Sim! Felizmente ainda há escritores e jornalistas sinceros que leem e estudam, escrevem com bom senso e procuram ensinar ao leitor a verdadeira Doutrina dos Espíritos. São ajuizados, não usam expressões verbais que recomende costumes, práticas, ideias políticas, sociais ou religiosas adversas ao Espiritismo.Em Conduta Espírita, André Luiz assevera que um texto espírita deve ajustar-se à simplicidade e clareza, concisão e objetividade, passar por revisão austera e incessante, quanto ao fundo e à forma, antes de ser publicado. Os escritores devem despersonalizar, ao máximo, os conceitos e as colaborações, convergindo para Jesus e para o Espiritismo o interesse dos leitores. (6)
É imprescindível que a imprensa espírita esteja compromissada com a ética, com a verdade revelada pelos Espíritos e com a melhor qualidade dos temas divulgados. Melhoria essa que não deve ser considerada exclusivamente a "beleza exterior", com apresentação gráfica policrômica, mas, sobretudo, o conteúdo (mensagens). Importa afrontar desafios e ter capacidade de informar sobre os fatos e os preceitos espíritas, de forma a colaborar com o leitor em sua consciência crítica.
Os editores necessitam "sistematicamente despersonalizar, ao máximo, os conceitos e as colaborações, convergindo para Jesus e para o Espiritismo o interesse dos leitores” (7) sem perder de vista a seleção dos escritos, que precisam ter "clareza, concisão e objetividade, esforçando-se pela revisão severa e incessante, quanto ao fundo e à forma de originais que devam ser entregues ao público". (8) Porém, lamentavelmente existem órgãos de imprensa espírita que mais não fazem senão exacerbar a arrogância dos responsáveis das instituições, publicando sistematicamente suas “fotos e nomes dos dirigentes”, numa clara manifestação de completa ausência de humildade.
É bom refletirmos sobre isso! Recordemos o Espírito Emmanuel, que avisa: "o Espiritismo nos solicita uma espécie permanente de caridade – a caridade da sua própria divulgação". (9) Consideração e homenagem à virtude, ao talento, à coragem, às boas ações dos verdadeiros jornalistas espíritas e seus periódicos, imunes ao endosso às práticas antidoutrinárias; que sigam avante na tarefa de amor às letras do Consolador, que fazem vibrar corações e jubilam os espíritas que a elas se consagram.
Referência blibliográfica:
(1) Xavier Francisco Cândido. O Consolador, ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000, perg. 218
(2) Publicado na Revista "Reformador", de 1.º de abril de 1893
(3) Disponível em http://www.feparana.com.br/biografia.php?cod_biog=200 acessado em 14/04/2013
(4) Disponível em http://www.autoresespiritasclassicos.com acessado em 16/04/2013
(5) Kardec Allan. Revista Espírita de maio de 1863, Brasília: Ed Edicel, 2001
(6) Vieira Waldo. Conduta Espírita, ditada pelo Espírito André Luiz, RJ: Editora FEB 1989
(7) idem
(8) idem
(9) Xavier , Francisco Cândido. Estude e Viva, Rio de Janeiro: Ed FEB, 1971